Sem Censo 2021, vários municípios paraenses serão prejudicados; veja casos
Fonte do Blog Zé Dudu - Na matemática do IBGE, São Félix tem
132 mil habitantes, quando todos seus indicadores básicos — número de
eleitores, de matrículas na educação básica, de nascimentos, de óbitos, de
residências, de inscritos em programas sociais — apontam 80 mil.
A não realização do Censo Demográfico 2021 pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por conta de corte no orçamento
da maior empreitada de coleta domiciliar do país, traz mais riscos que
benefícios para os cofres públicos e por uma razão muito simples: é o número de
habitantes, contados pelo instituto, que serve de base para distribuição de
muitos recursos públicos, um dos quais o Fundo de Participação dos Municípios
(FPM). Além disso, os dados do censo servem de baliza para calcular o Índice de
Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) e saber, enfim, quanto o país evoluiu
em qualidade de vida na década.
O senador e
líder do governo no Congresso Nacional, Eduardo Gomes, assegurou que o
orçamento será ajustado para que o Censo 2021 possa ser realizado. A informação
é da Rádio Senado. Mas, em meio ao fogo cruzado se realiza ou não o
recenseamento geral da população, o dilema do IBGE afeta muitos municípios
brasileiros, alguns deles no Pará, que vivem sob desconfiança do último censo,
realizado em 2010, e das estimativas da população, atualizadas anualmente para
servir de parâmetro ao Tribunal de Contas da União (TCU) com vistas aos
repasses constitucionais.
Atualmente, ao
menos uma dezena de municípios no Pará tem problemas com dados das estimativas
do IBGE, para mais ou para menos. Isso porque as estimativas, por mais eficientes
e úteis que sejam, não conseguem captar a dinâmica populacional de um estado
com municípios muito frenéticos economicamente. Elas se baseiam em resultados
dos censos anteriores. Ou seja, para estimar a população de 2020, o IBGE fez
uma conta mais ou menos assim: pegou o dado do censo de 2010 e subtraiu pelo de
2000; o resultado dessa subtração foi dividido por dez e, em seguida, ajustado
a um fator de crescimento estipulado pelo órgão; e, por fim, adicionou o ajuste
ao número de habitantes encontrado em cada município em 2010.
47
superestimados em 2009
O grande
problema da salada de números do IBGE é que, frequentemente, não correspondem à
realidade. O Blog do Zé Dudu analisou, por exemplo, que da estimativa
populacional de 2009 feita pelo órgão para o censo 2010 houve várias
inconsistências, indo de um extremo em Marabá (que registrou 30 mil habitantes
a mais de um ano para outro) a Belém (que registrou 44 mil habitantes a menos
no período). Em outras palavras, a população estimada pelo IBGE para Marabá em
2009 estava 13% abaixo da realidade, enquanto a de Belém foi supercontada em
3%.
Tem mais: em
2010, 49 municípios paraenses apresentaram número populacional recenseado
inferior à estimativa do ano anterior, enquanto 27 ostentaram dado censitário bem
acima do estimado em 2009. Em ambas as situações, as estimativas estavam
completamente furadas.
Hoje, os
municípios de Canaã dos Carajás, Parauapebas, Altamira, Vitória do Xingu,
Senador José Porfírio, Prainha, Santarém Novo e Faro talvez sejam os mais afetados,
para menos, pela falta de censo que dê o veredicto da atual situação
demográfica local.
Canaã dos
Carajás e Parauapebas foram atravessados por projetos de mineração na década
passada, que movimentaram a economia local e atraíram miríades de trabalhadores
migrantes. Altamira, Vitória do Xingu e Senador José Porfírio foram sacudidos
pela implantação de hidrelétrica, com igual arregimentação de operários.
Prainha, Santarém Novo e Faro muito provavelmente tenham sido vítimas de
injustiças na contagem de 2010.
Dentro ou
fora da realidade?
Vários cadastros
administrativos depõem contra as estimativas do IBGE. Canaã dos Carajás, por
exemplo, tem mais eleitores biometrizados que a população total estimada pelo
instituto. O município tem o dobro de estudantes na rede pública municipal de
seu vizinho Xinguara, mas o IBGE registra mais habitantes em Xinguara. A rede
pública municipal de Canaã dos Carajás já tem quase tanto aluno quanto a de
Redenção. Canaã teria hoje, extraoficialmente, cerca de 65 mil moradores, mais
de 25 mil acima da estimativa que o órgão insiste em sustentar.
Em Parauapebas,
se os dados do censo 2000 e 2010 fossem levados à risca, o município teria hoje
245 mil habitantes, cerca de 26 mil acima do que o IBGE deve estimar para este
ano. Detalhe: a população urbana atual de Parauapebas — que o IBGE não divulga
nem a pau para resultados de estimativas — já está do tamanho da de Marabá e
poderá, no recenseamento, aparecer até maior.
Um dos
indicativos é que Parauapebas já tem mais estudantes urbanos na rede municipal
que a rede de Marabá. A cidade de Parauapebas também possui mais estudantes do
ensino básico na rede privada. E está empatada com Marabá em número de alunos
da rede estadual. Além disso, Parauapebas já está com 300 eleitores biometrizados
a mais que Marabá e o número de domicílios com medidores de energia é
ligeiramente maior que a quantidade do vizinho, no âmbito urbano.
Em Altamira,
Vitória do Xingu e Senador José Porfírio a situação de subestimativa é
parecida. Altamira, por exemplo, já teria hoje pelo menos 130 mil habitantes,
15 mil acima do estimado pelo IBGE, enquanto Vitória teria 5 mil a mais —
parece pouco, mas é um terço da atual população local. Em Senador José
Porfírio, Prainha, Santarém Novo e Faro, a situação é tão absurdamente
equivocada que o cadastro único do Governo Federal, com atualização mensal, já
tem mais pessoas inscritas que a população local total inteira.
Perdas
milionárias para todos
O grande
problema é que, à exceção de Parauapebas, todos os demais municípios com
população subestimada podem estar recebendo FPM abaixo do correto. Em Canaã dos
Carajás, se as previsões de população acima de 60 mil habitantes se
confirmarem, o prejuízo beira os R$ 100 milhões em recursos públicos não
recebidos.
No outro extremo,
há situações como a de São Félix do Xingu, cuja população é superestimada a
muito além da realidade, mania de grandeza que é, também, comum a Ulianópolis,
Santana do Araguaia e Jacareacanga — neste último, a prefeitura conseguiu
manter na justiça a chamada “população judicial” de extravagantes 41 mil
habitantes. Na matemática do IBGE, São Félix tem 132 mil habitantes, quando
todos seus indicadores básicos — número de eleitores, de matrículas na educação
básica, de nascimentos, de óbitos, de residências, de inscritos em programas
sociais — apontam 80 mil.
Com esses e
outros números controversos, o Governo Federal segue pagando mais cota-parte de
FPM do que deveria, tanto a São Félix quanto a pelo menos mais outros 100
municípios do país com população exagerada. Na contramão, outras tantas
prefeituras seguem em franco prejuízo. A soma de gastos com pérolas e batatadas
das estimativas em defasagem ultrapassa os R$ 2 bilhões exigidos para a
operação censitária. Mas a União, ao apresentar a proposta de orçamento para
2021 não reconhecendo a importância do censo, parece preferir permanecer no
prejuízo.
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